A origem do Kung Fu, como o conhecemos hoje, está relacionada, de um lado, ao
militarismo do povo chinês, e de outro, a vinda de Bodhidharma da Índia para a
China. Quanto ao militarismo, ou ao espírito guerreiro do povo chinês, as
explicações são controvertidas. Alguns atribuem este "espírito guerreiro do povo
chinês", primeiro a grande extensão do território, que dificultava a proteção das
fronteiras, segundo as invasões estrangeiras que obrigavam os imperadores a
manterem grandes exércitos, terceiro as guerras internas entre os "senhores
feudais" e os imperadores. Não nos parece que um povo se restrinja aos
governantes com seus exércitos; de modo que não parece correta a proposição
que atribui a origem do kung fu ao militarismo do povo chinês. Há ainda outro
fator: a miséria e a superpopulação. A maioria não tendo nada, matava por um
prato de comida, e o restante era obrigado a defender o pouco que possuía com a
própria vida. O argumento é que este estado de miséria gerou um interesse
natural do povo pelas artes marciais. De um lado, a necessidade dos imperadores
de manterem grandes exércitos, de outro, o interesse do povo pelas artes
marciais, gerado pela necessidade de garantir a sobrevivência. A necessidade de
defender o território e pouca preocupação com a vida, de um lado e, de outro, a
necessidade de sobreviver e nenhuma preocupação com território.
Um fato histórico onde se pode verificar uma certa manifestação do espírito
guerreiro do povo chinês, foi a revolução dos boxers, onde a população e certas
lideranças políticas estiveram unidas contra os desmandos do governo envolvido
em corrupção e tráfico de ópio. No entanto, os boxers insuflam o povo à revolta,
apelando muito mais para um espírito nacionalista do que para sua consciência de
povo, conforme demonstra um dos cartazes afixados em Pequim na noite inicial
da revolta, o qual reproduzimos abaixo.
"O Santo imperador Chu Hung Tang avisa a todos os discípulos de Budha: morte
aos demônios do oeste que oprimem nosso país escarrando sobre nossos deuses
e roubando nossas riquezas. O grande momento já foi escolhido pelo destino. O
céu não permitirá que aqueles que violaram tantas sepulturas para abrir caminho
para suas máquinas de ferro e que tomaram a força às terras dos filhos do sol
escapem à condenação de seus crimes. Insolentes como são, esses bárbaros não
recuam diante de nada. É por essa razão que nós, membros da Sociedade
Harmoniosa do Punho Fechado, membros da arte marcial chinesa, da justiça e da
concórdia, o convidamos a massacrá-los sem piedade no cair desta noite".
O texto deste cartaz indica bem o espírito nacionalista da apelação. Este espírito
não tem seu fundamento nas artes marciais, nem tampouco é este espírito um
fundamento para as artes marciais. Pensamos que não dá para atribuir a origem
das artes marciais, na china, a um espírito próprio de seu povo, mas a um
conjunto complexo de fatores que, decerto, inclui também este espírito.
Chamamos a atenção também para a noção incorreta do termo povo, na
expressão "espírito guerreiro do povo chinês", no contexto que anunciamos aqui.
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